sábado, agosto 13

FÉRIAS

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Blogar todos os dias também cansa, logo decidi encerrar para férias. Regresso sine die! Quanto às férias da blogoesfera são, como sempre, um puro prazer egoísta já que por cá vou passando e lendo o que resto da «comunidade» vai postando.

Entretanto, durante as férias, para quem é um leitor compulsivo como eu, é tempo de nos atiramos a alguns livros que, na voragem dos dias que passam, vão ficando em standby. Quem por cá anda na blogoesfera seguramente que padece do mesmo vício da leitura obsessiva. Assim, para aqueles que mais estimo no underworld da blogoesfera peço que relevem o descaramento de algumas sugestões personalizadas. Na lista que se segue não há qualquer colagem literal ou subliminar do título ao leitor. Importa sim o sumo destas delícias que já consumi e cuja leitura ou releitura recomendo com apreço.

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Para o Nuno Barata: «NeoConservadorismo» (Ed. de 2003 da Quetzal) a controversa e politicamente incorrecta obra de Irving Kristol que se definia como «um liberal submerso pela realidade». Esta bíblia dos neocons foi escrita por um homem que confessa ter sido neomarxista, neotrotskista, neo-socialista, neo-liberal e,por fim, neoconservador! Enfim um farol de Esperança.

Para o grandioso amigo Pedro Arruda recomendo particularmente «O Insólito Mr.Mee», de Andrew Crumey (Ed. de 2000 da Temas & Debates), que é apenas uma hilariante comédia sobre Mr. Mee que um dia resolve trocar o pó da biblioteca por um «computador», mas logo na sua primeira sessão de google, em vez de encontrar o que buscava, esbarra na imagem de uma ninfeta desnuda a ler um livro... «numa pose que as senhoras adoptam quando estão a dar à luz».

Para o meu estimado Médico de Família, Carlos Falcão Afonso, sabendo das escassas oportunidades que possui para dedicar às minudências da ficção literária ainda assim não daria o seu tempo por mal empregue com «A Quarta Mão» de John Irving (Ed. Asa de 2003)... uma cruel sátira sobre os caprichos de um transplante de uma mão efectuado por um cirurgião anoréctico que se vê envolvido no romance entre o transplantado, os media e a viúva do dador!

Para o Tózé Almeida, que inexplicavelmente nos abandonou sem pré aviso ou justa causa. Partilho com ele o gosto comum pela obra de Douglas Coupland. Desta feita fica a recomendação de «Eleanor Rigby» (Ed. Teorema 2005), o 9º livro de Coupland que mistura solidão, doença, romance, humor e esperança ao estilo do precedente «Todas as famílias são psicóticas». Tudo isto muitos furos abaixo do quilate do costume, mas ainda com o timbre que conquistou uma legião de leitores.

Para o eurocrente André Bradford fica a sugestão de «Nem Aqui, Nem Ali - A Europa de Estocolmo a Istambul» de Bill Bryson (Ed. Quetzal 2004). Este livrinho de viagens light é a companhia ideal para uma tarde de piscina entremeada de Bacardis e acepipes estivais. O tom é predominantemente jocoso, porém lá diziam os clássicos que «ridendo castigat mores». Seja como for destaco o único parágrafo sério ao longo de 298 páginas: «Fascinava-me que os Europeus pudessem simultaneamente ser tão parecidos - que pudessem ser livrescos e cerebrais de modo tão universal, conduzir carros pequenos e viver em casa pequenas em cidades antigas, amarem o futebol, serem relativamente não materialistas e cumpridores da lei, e terem quartos de hotel gelados e lugares confortáveis e convidativos para comer e beber - e serem, não obstante, também tão interminável e imprevisivelmente diferentes uns dos outros. Eu adorava a ideia de que nunca se pode estar certo de nada na Europa.» Isto é quanto basta para justificar um voto no NÃO a qualquer intentona hegemónica e que tenda a padronizar pelo mesmo nível 25 cidadanias.

Para o franco e romântico João Pacheco Melo recomendo uma pequena mas deliciosa monografia que ostenta o seguinte título: «Observações sobre a Ilha de São Miguel recolhidas pela Commissão enviada à mesma Ilha» por Luiz da Silva Mouzinho de Albuquerque (Ed da Câmara Municipal da Povoação / Signo. facsimilada da ed. de 1826 da Impressão Régia). Este relatório endossado à Coroa Portuguesa encerra, especialmente no capítulo sobre a «Distribuição da Propriedade», uma crítica demolidora à estrutura dominial de São Miguel. À data de 1826 escrevia o cronista que «a trôco, com effeito, de hum pequeno número de famílias, que possuem muito além do necessario, e cómmodo rendimento, o Povo de S.Miguel he por extremo miseravel. O Povo de S.Miguel, pobre, e miseravel, consome apenas dos géneros do Paiz a porção strictamente necessaria, e ás vezes até dessa carece». Claro está que este quadro miserável é hoje uma recordação distante na Região do superavit. Porém, embora o tom profético seja ameaçador, não é de todo inútil recordar as palavras de Luiz da Silva Mouzinho de Albuquerque que vaticinou que: «A prosperidade, e a riqueza tomárão em S.Miguel o mesmo curso que as aguas: em vez de derramadas em arroios fertilisarem o solo daquella Ilha, accumulárão-se, pouco e pouco em torrentes, que diminuirão a sua fertilidade, ameaçando esterilisa-la hum dia».

Para a indispensável e insubstituível Ana Falcão sugiro «Um Filho do Circo» de John Irving (Ed. de 1997 da Livros do Brasil). Aqui está mais um «tijolo» de John Irving que desafia a indulgência de qualquer leitor. Todavia, esta mordaz saga que tem na personagem do médico Dr.º Daruwalla o fio condutor, é povoada de estórias de Bombaim e Bollywood, um decadente Duckworth Club e um crime cuja autoria tentamos desvendar, personagens bizarras entre as quais os (ou as) hijras, férias em Goa entre uma comunidade hippie que de pacífica apenas tem a fama... é uma salada indiana que merece uma leitura divertida.

Para a mais erudita, mas sempre refrescante, participação da blogoesfera Açoriana deixo à consideração do Carlos Riley o romance «As Novas Confissões» (Ed. D.Quixote, Lisboa 1990) de William Boyd que opera um magistral paralelo com as celebérrimas «Confissões» de Jean Jacques Rousseau (Ed. Relógio d'água, 1988). Esta é a saga de um homem só que nos agarra da primeira linha à última. John James narra a sua vida cujo primeiro «acto ao entrar neste mundo foi matar minha mãe»... muito à semelhança do Jean Jacques que na obra citada confessa: «o meu nascimento custou a vida de minha mãe e foi a minha primeira desgraça». Enfim vidas atribuladas como também o foi o decurso do Sec. XX que é narrado na perspectiva da confissão da personagem de William Boyd. Pela mão de John James percorremos as trincheiras de Ypres, a Alemanha cosmopolita antes da ascensão Hitler, a libertação do Dia D, a caça às bruxas de Hollywood, e um fenecer da vida sob o principio da incerteza.

Para o Alexandre Pascoal gostaria de entregar em mão própria a Edição que resumirá quatro anos de mandato da Dr.ª Berta Cabral à frente dos desígnios da Câmara Municipal de Ponta Delgada... sempre servia para ir refrescando os motivos de recorrente e militante crítica do camarada Pascoal... infelizmente, ao que sei, esta edição está ainda indisponível.

Para o Nuno Mendes, um dos melhores Jornalistas que esta terra já conheceu (e amável Chefe de Redacção do Jornal dos Açores onde às terças tinha por costume editar uma coluna da minha autoria), presumindo que anseie por estar bem longe desta silly season remeto-o para os antípodas com «Na Patagónia» (Ed. de 1995 da Quetzal) do andarilho Bruce Chatwin.

Para as Miauu Girls um livro muito Zen que dá pelo nome de «Aprendizagem da Serenidade» (APRE!) de Louis PauWels (Edição da Verbo de 1979 - à data só um quarto das Miauus era já nascido) e repleto de úteis axiomas como este: «Levantar cedo cura tudo».

Para o genial Nuno Costa Santos Melancómico a sugestão da leitura ou releitura de «Tanto Quanto me Lembro», as notáveis memórias do seu avô Raul Gomes dos Santos numa Edição de autor de 2001.

Para o Pedro Gomes inevitavelmente ocorreu-me «O Melhor Anjo» de Frank Ronan (Ed. de 1993 da Gradiva)... melhor título era difícil, porém o livro também não é de deitar fora, mas ainda assim fica aquém de «A Morte de um Herói» e de um magistral «Os Homens que Amaram Evelyn Cotton».

Para a Mariana Matos uma obra necessariamente socialista: «O Caminho Para Wigan Pier», de George Orwell, que foi inclusivamente encomendada e criticada pelo Left Book Club(!).

Finalmente, mas não menos relevante, para o «empresário» cultural Victor Marques é tempo de «Resistir» com Ernesto Sabato (Ed. de 2005 da D.Quixote). Afinal o que importa é que «temos que reaprender o que é gozar. Estamos tão desorientados que acreditamos que gozar é ir às compras quando um luxo verdadeiro é um encontro humano». Prefiro de longe «O Túnel» mas, ainda assim, este «Resistir», editado pela primeira vez aos 89 anos(!), merece a nossa reverência e é um ligeiro, mas acertado, ensaio sobre a cultura contemporânea e a «globarbarização».

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Post-Scriptum: Bem se sabe que os comunistas não vão aos blogues e que até os seus dirigentes rotulam estes como um desfile de vaidades. Seja como for não resisto a pensar que entre aqueles empedernidos comunistas, especialmente da Juventude Comunista, o proselitismo ideológico já não seja o que era. Assim para a Lurdes Branco (que aqui não tem mais palco do que o de uma personagem-tipo) recomendo a obra de uma ex-comunista: «O Socialismo que eu vivi», de Cândida Ventura (Ed. de 1984 de O Jornal). É apenas a lúcida visão de quem antes do tempo aceitou que «...não sabia que nos países onde os partidos comunistas se tinham instalado no poder exerciam uma ditadura sobre a classe operária, sobre todo o povo».

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Cá por mim no que respeita a leituras, e porque não me safo da etiquetagem de «menino-bem de Ponta Delgada» vou tentar sofregamente digerir o livro do «Choque de Gerações - o Programa que, mais do que sobre o saber, é sobre o pensar» (Ed. coordenada por Joel / Neto, Diário Insular 2005). Talvez seja iluminado com o ânimo de «Um Lavrador da Agualva, um pensionista de Santo-António Além Capelas ou um Jovem advogado da Piedade»!

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Posto isto até um dia destes num blog perto de si!

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