sexta-feira, outubro 13

ÍCONES DO SEC. XX - # 8

"To me, consensus seems to be the process of abandoning all beliefs, principles, values and policies. So it is something in which no one believes and to which no one objects"
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Margaret Hilda Roberts Thatcher iniciou a sua vida profissional com uma licenciatura de Oxford em Química à qual, mais tarde, adicionou uma licença para exercer Advocacia na área do Direito Fiscal! Como alquimista não foi além de assalariada num laboratório que desenvolveu o protótipo do sundae; como fiscalista enterrou-se politicamente com uma impopular poll tax, ou seja, um imposto per capita cuja tributação era independente do rendimento. Pelo caminho foi a primeira mulher a assumir o cargo de Primeiro-ministro do Reino Unido e, no Sec. XX Britânico, foi o Primeiro-ministro que mais tempo esteve no poder ([1]).

Começou a sua idiossincrática carreira política como deputada Conservadora na Câmara dos Comuns. Durante esses anos de tirocínio na oposição parlamentar Thatcher deixou registo da sua peculiar personalidade liberal e conservadora: por um lado ,votou favoravelmente a descriminalização da homossexualidade e apoiou, com o seu voto, a legalização do aborto, mas, por outro lado, manteve-se inflexível na defesa da pena capital e opôs-se à simplificação do processo de divórcio. No seu debute governativo, como Secretary of State for Education and Science, no Governo Conservador de Edward Heath (1970-1974) inaugurou uma galeria de alcunhas sendo à data conhecida por "Thatcher Milk Snatcher", pois abolira a distribuição universal e gratuita de leite nas escolas retomando, paradoxalmente, uma medida do anterior governo Trabalhista obcecado em reduzir o orçamento da Educação.

O cognome de "Dama de Ferro" surge, mais tarde, pela primeira vez como um mimo do "Krasnaya Zvezda" ([2]) em réplica editorial ao discurso de 19 de Janeiro de 1976 em Kensington Town Hall ([3]). Nesse recuado ano da década de setenta Mrs. Thatcher era apenas líder da oposição numa decrépita e descredibilizada Grã-bretanha. Contudo, o tom do discurso da "Iron Lady" era premonitório de um indomável voluntarismo que iria transformar o Reino Unido e por arrasto o Mundo.

Nesse célebre discurso, numa época em que a expansionista União Soviética construía um submarino nuclear por mês, para fins ostensivamente hostis como é óbvio, Margaret Thatcher quebrava o gelo da detente ao assertivamente advertir que os sovietes eram apenas uma superpotência a nível militar. Pese embora a propaganda alardeasse o contrário, a Pátria do Comunismo era, na realidade, um fracasso em termos humanos e económicos cuja exportação, por via da Internacional, era um perigo real. Thatcher ilustrou o perigo da deriva expansionista da União Soviética ao evocar a tentação da cubanização do nosso País. No discurso de Kensington exemplificou para os descrentes: "We have seen the Communists make an open grab for power in Portugal, our oldest ally. A sign that many of the battles in the Third World War are being fought inside Western countries.".

Após a primavera eleitoral de 1979, Thatcher passa a governar o Reino Unido com férrea personalidade impondo a sua política, mesmo contra as vozes críticas do Partido Conservador. Modernizou a velha receita liberal de "Menos Estado, Melhor Estado" e, em consequência, cortou drasticamente na carga fiscal colocando no pedestal da economia o modelo do mercado livre. Numa época em que a Europa vivia entretecida na teia do Socialismo, Thatcher iniciou uma revolução económica com a privatização de empresas cuja sacrossanta tutela seria sempre pública independentemente de laborarem atavicamente "no vermelho". Iniciou esta política com uma British Airways, tecnicamente à beira da bancarrota, privatizando-a e metamorfoseando-a numa das mais lucrativas companhias aéreas do Mundo! Foi uma verdadeira "Revolução Conservadora" e um rude golpe no Keynesianismo e no Welfare State. No passo seguinte inicia uma política reformista de "Capitalismo Popular" ! A receita é tranversal pois, se por um lado, faculta a preferência da venda maciça das casas arrendadas com o programa "Right to Buy", por outro lado, expande as privatizações em massa criando novos e ricos capitalistas.

Alma gémea de Ronald Reagan, entretanto eleito Presidente dos Estados Unidos da América em 1980, acicatou ideologicamente a política de afrontamento à União Soviética indo ao ponto de estacionar mísseis de cruzeiro em solo Britânico, directamente apontados para lá da cortina de ferro. A história veio a dar-lhe razão, bem como o seu quinhão de glória na derrocada da União Soviética. Contudo, os ventos de guerra sopravam dos antípodas pois, nas Falklands ([4]), nas palavras ácidas de Roger Waters ([5]), "Galtieri took the Union Jack". Efectivamente, em Abril de 1982, a Argentina invadia as Falklands, numa encenação de patriotismo trauliteiro que foi prontamente rechaçado pela têmpera de Thatcher e pelo aço do exército Britânico que nunca abandonou a sua Pátria. A "Dama de Ferro", ao "comando" do exército Britânico, recuperou a Union Jack hasteando-a de novo em port Stanley. A guerra das Falklands Islands, ou Islas Malvinas para os enxovalhados Argentinos, resultou no fim da ditadura na Argentina e num recrudescimento da popularidade de Thatcher.

Internamente, Thatcher enfrentaria ainda com êxito o IRA, sobrevivendo inclusive a um ataque terrorista. Também, com marcial determinação não cedeu a uma poderosa greve mineira, e após um ano de intenso conflito laboral e social derrotou o National Union of Mineworkers. Pulverizada a influência sindical em 1985 Thatcher encerrou várias minas e privatizou as restantes que tinham viabilidade económica e empresarial.

O declínio e queda de Margaret Thatcher consumou-se no final da década de 80 motivado externamente pelo isolacionismo eurocéptico coadjuvado pela animosidade social gerada com o lançamento da impopular poll tax.

Margaret Thatcher foi indubitavelmente um ícone do Sec. XX cujo magnetismo, carisma, e voluntarismo, gerou legiões de acólitos que ainda hoje a colocam no Top de Grandes Líderes do Séc. XX. Também incendiou populares e viscerais ódios de estimação que, por certo, preferiam ver Maggie no cadafalso embalada nos acordes de "Margaret On The Guillotine" ( [6] ) de Morrissey.

Margaret Hilda Roberts Thatcher nasceu a 13 de Outubro de 1925. Hoje, aos 81 anos, a "Dama de Ferro" enferruja tranquilamente em Londres.

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Links :

Thatcher Foundation
"Margaret Thatcher: a política que nunca quis agradar", por
Jorge Almeida Fernandes no Público

"Thatcher's children", um excelente artigo de Simon Jenkins no Guardian
Leaders and Revolutionaries da Time
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Notas :

[1] Para uma sinopse histórica dos Prime Ministers recomenda-se um tour ao site oficial do n.º 10 de 10 Downing Street, mais concretamente em http://www.number-10.gov.uk/output/Page123.asp [2] o.s."Estrela Vermelha" que, à data, era o jornal do exército soviético - http://www.redstar.ru/ [3] O discurso integral, "Britain Awake", pode ser lido na integra no site da Fundação Margaret Thatcher em http://www.margaretthatcher.org/speeches/displaydocument.asp?docid=102939 [4] Sobre a Guerra das Falklands v. o site: http://www.falklandswar.org.uk/ [5] "The Final Cut - A Requiem for the Post War Dream by Roger Waters, performed by Pink Floyd", editado em 1983 é um documento negro e caústico sobre esses anos da Guerra Fria e particularmente crítico para Maggie Thatcher. [6] "The kind people Have a wonderful dream / Margaret on the guillotine / Cause people like you Make me feel so tired / When will you die? Do not shelter this dream / Make it real." Assim se ouvia Morrissey em 1988 no album Viva Hate !

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posted by João Nuno Almeida e Sousa

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