quarta-feira, junho 4

The Special Ones # 1 - Harold Ickes


O nome Harold Ickes (de pé, na foto) provavelmente não diz nada à maioria das pessoas, mas é sem dúvida um dos grandes derrotados da noite eleitoral de ontem. Com o anúncio histórico de Obama, Hicks viu ruir um trabalho de meses, no âmbito da campanha de Hillary Clinton, um trabalho um pouco secreto, um pouco sujo, um pouco frustrante, um pouco incómodo, e, por isso mesmo, um trabalho que o casal Clinton atribuiu ao seu amigo e confidente de (quase) todas as lutas.
Conhecido pelo seu mau feitio e, sobretudo, por ter mordido na perna um adversário político, Ickes trabalhou no staff de campanha de diversos candidatos democratas, sem, contudo, ter ganho uma única vez, até chefiar a campanha de Bill Clinton em Nova Iorque, o que o levaria a vice-chefe de Gabinete. Além de mandatário de Hillary na campanha para o Senado, foi adversário de Howard Dean na corrida à presidência do Partido Democrata e é membro do Democratic National Committee's Rules and Bylaws Committee.
Ora, foi precisamente nessa condição que Hillary o encarregou de "trabalhar os telefones" da maioria dos membros daquele organismo interno do Partido, no sentido de conseguir, por um lado, arregimentar os votos necessários para que os resultados das Primárias da Florida e do Michigan contassem para o apuramento de delegados - recorde-se que os dois estados desrespeitaram as indicações do Partido e anteciparam a data das respectivas primárias, o que fez com que Hillary concorresse sozinha - e, por outro, mudar o sentido de voto da maioria dos ditos superdelegados (em Portugal, delegados inerentes).
Apesar de um "ligeiro" problema de partida (enquanto membro do Rules and Bylaws Committee, e antes das instruções de Hillary, tinha defendido a anulação das eleições na Florida e no Michigan), Ickes levou a missão a sério, até às desilusões dos últimos dias.
Tendo perdido um rim nas escaramuças anti-racismo dos anos 60, Ickes tornou-se um afamado operacional de bastidores, embora os resultados obtidos não fiquem propriamente bem num currículo que se pretenda exemplar. Conseguiu apoiar o único Kennedy que não chegou a candidato presidencial, Ted, e esteve ligado a nomes tão improváveis como Eugene McCarthy, Ed Muskie ou o Reverendo Jesse Jackson. A táctica foi quase sempre a mesma: apoiar o underdog, levá-lo até à Convenção e aí tentar todos os truques de bastidores possíveis e imagináveis para levar a sua avante. Com Jackson, por exemplo, trocou o apoio a Michael Dukakis pela complexa regra dos delegados automáticos - como prefere chamar aos superdelegados - que acabou por conduzir ao que hoje sabemos. Com Hillary, o cenário de partida era bastante diferente, mas uma campanha estrategicamente desastrosa levou-o a retomar o caminho que sempre trilhou, até ontem.
Em "Primary Colours", o romance anónimo do jornalista Joe Klein, sobre o casal Clinton, Ickes é Howard Ferguson, o chefe de campanha, a quem John Travolta, na pele de Bill Clinton disfarçado de Governador Jack Stanton, dizia uma frase memorável: "Sabes o que eu vou fazer? Vou fazer algo de verdadeiramente ultrajante. Vou dizer a verdade!".

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