quinta-feira, abril 2

O navio fantasma

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As habituais sereias cor-de-rosa, negando as evidentes vicissitudes do transporte marítimo de passageiros e veículos nos Açores, afinam a voz para o coro do costume. Afirmam que esta é mais uma obra estruturante para o "povo açoriano" - (o mesmo que foi riscado da letra de lei do Estatuto) - e do mesmo estalão de outras similares. Exemplo dessa ordem de grandeza são as "Portas do Mar", as "Scut´s", e as demais obras megalómanas cujo impacto, presente e futuro, nas finanças desta região do superavit é um exercício académico cujos resultados, por certo, não seriam compatíveis com os ratios de custo-benefício existentes nos países desenvolvidos. Se se considera que os barcos da Atlânticoline representarão um êxito comparável, e complementar, ao das "Portas do Mar" cremos que pouco mais há a acrescentar. São empreendimentos de utilização sazonal sendo que no caso dos barcos não se sabe ainda se será para esta saison que os veremos atracados às "Portas do Mar". A sociedade armadora e o Governo Regional prometem a sua "aparição" para o dia 13 de Maio deste ano, mas só os crentes aceitam este acto de fé.

O mais recente episódio deste intrincado processo emergiu recentemente com o Relatório do Tribunal de Contas que "afunda" a expectativa de sustentabilidade e a credibilidade deste projecto. Depois de 2 concursos internacionais para a construção de 2 navios, pelo custo total estimado em 40 milhões de €uros, fica a certeza de que já se deitaram ao mar muitos €uros mas, no horizonte próximo, não há à vista qualquer barco. Estes teimam em não sair do estaleiro e não resistem a sucessivas correcções. Nesse sentido, registou o Tribunal de Contas que já foram efectuados 4 aditamentos numa das embarcações sendo que parte dessas alterações não são "trabalhos a mais", justificáveis tecnicamente, mas apenas compreendidas como "mudanças de intenção do dono da obra"(sic.!). Por exemplo, a mais recente alteração de "intenção do dono da obra" custou aos contribuintes cerca de 4 milhões de €uros apenas para o aumento do número de camarotes e restyling da zona habitacional da embarcação ! Não se tratando de um luxuoso navio de cruzeiro mas de um modesto ferry, porventura com velocidade inferior ao mítico "Ponta Delgada", não se concebe que o projecto ande assim à deriva e ao sabor das "intenções do dono da obra". Ao Tribunal de Contas restou a óbvia recomendação de que seja apurado o grau de responsabilidade dos intervenientes, sem deixar de censurar custos adicionais que não são "trabalhos a mais", e sucessivos atrasos contratuais que não mereceram qualquer penalização dos responsáveis, nem sequer através das habituais "multas" contratuais. No resto, continuam os Açorianos à espera de um barco novo cujos defeitos congénitos prometem mais tempo de "oficina" e manutenção em doca seca do que efectiva navegabilidade. Projectado na Rússia (?), mas apadrinhado pelos estaleiros de Viana do Castelo, o ferry "Atlântida" tem um lastro considerável de falhas de estabilidade (intacta e em avaria) que mereceu até a distinção do Instituto Portuário e de Transportes Marítimos com a certificação de 100 reservas à operacionalidade e segurança da embarcação. Uma check list negra ! Tudo isto é suficiente para reiterar a certeza de que permanecem sine die as reservas de marcações para este barco de recreio cujo custo, bem repartido pelos Açorianos, subsidiaria outras formas de mobilidade.
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João Nuno Almeida e Sousa nas crónicasdigitais do jornaldiário.com

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