domingo, setembro 28

ao viés


Para Breyten Breytenbach, intelectual sul-africano (um dos maiores, dizem), entrevistado por Clara Ferreira Alves (Atual nº 2185|Expresso 13 Setembro 2014), “vivemos numa nova configuração tribal”. E “uma das piores tribos é a dos turistas. Matam tudo. (…) Os turistas são uma massa sólida pior do que o terrorismo, de certo modo”.
Ler esta fecunda e provocatória afirmação categórica, foi como ter sido atingido nos queixos por um forte uppercut (de esquerda, claro), resultando numa tal sensação de desnorte à qual se juntou a de náusea, provocada pela visão emproada e preconceituosa da claramente-intelectual-também interlocutora, lançada sobre a classe média, supostamente carregada de “mediania, indiferença estética. Mau gosto. Tédio”, como numa espécie de tentativa de extrapolação do raciocínio(?) do entrevistado.
Há coisas que nos deixam abananados, verdadeiramente perplexos, quando vêm de supostos vultos (seja lá o que isso for). Eu, que estava absolutamente crente nos testemunhos provenientes da O.M.T. e que se referem ao Turismo como a “Indústria da Paz” e uma das mais importantes para a preservação da memória colectiva das civilizações, tenho que dar a mão à palmatória: depois de alguns anos passados, a malta já se esqueceu das guerras mundiais e da silenciosa-mas-vibrante guerra fria, que fizeram com que todos quantos com elas sofreram aspirassem a uma nova ordem social mundial.
Ok! É verdade que a deliciosa aspiração depressa se tornou em algo talvez demasiado global e indiferenciado para qualquer intelectual que defenda acerrimamente a causa que o alimenta, ainda que, em alguns casos, o faça com um discurso de surdos. Não é, por isso, de estranhar que os aludidos possam dar-se ao luxo de assim falar, até porque, aparentemente, aquela “massa sólida pior do que o terrorismo” vem da “classe média, pilar dos regimes e da estabilidade”. Nada pior, para os intelectuais que querem continuar a poder fazer-se ouvir.
Não me sai da cabeça que, agora, talvez tenhamos que condescender alguns ataques terroristas, perpetrados contra turistas nos sítios do costume. Pelo menos os mais levezinhos, talvez. Mas o meu pior e verdadeiro receio é poder vir a ser obrigado a ter que compreender, verdadeiramente, as palavras destas duas alminhas que se podem ter perdido pelo mundo.


foto daqui




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